segunda-feira, 23 de julho de 2007

Sábado passado fui assistir a um concerto fabuloso. O Steve Hogarth, actual vocalista dos Marillion deu um concerto no espaço Servartes, aqui no Porto. Foi uma performance altamente intimista: devíamos estar umas 50 pessoas na sala, ele, o piano e o Mac.
Foi uma experiência religiosa: ele não só é um excelente cantor (já agora, também toca piano lindamente), como sobretudo consegue INTERPRETAR os temas, algo que nem todos os vocalistas são capazes de fazer. O ambiente era informal. Perguntava ao público quais os temas que queriam que tocasse, enquanto entre as músicas lia excertos do seu diário (daí estar lá o Mac...) ou contava histórias de quando alucinou com cogumelos numa festa com os Marillion, numa altura em que estavam retirados para gravar.
Tudo estava no ponto, portanto. As velas espalhadas pelo palco (?) e pela sala ajudavam a tornar ainda mais intímo o ambiente.
Estou a contar-vos isto não só por causa do concerto em si, mas por aquilo que ele representou. Mais do que uma série de canções, este tipo veio entregar-se nas mãos do público. Não era só a forma como cantava, com os sentimentos todos a afinarem-lhe as notas na garganta, mas a forma aberta com que se deu a conhecer, as histórias que contava acerca dos temas. E isto foi para mim muito especial porque tem muito a ver com a forma como encaro a coisa.

O que pretendemos fazer não é um conjunto de músicas. Mais do que isso, este projecto só me faz sentido se puder expôr um conjunto de sentimentos e experiências pelas quais temos passado. Por exemplo, não pretendo desvendar todo o significado implícito das letras que faço. Isso seria limitar o gozo da descodificação. Mas não consigo imaginar escrever sobre outras coisas que não sejam coisas minhas. No fim, como peças de um puzzle, ficarão a saber mais alguma coisa sobre mim. Acho que se não o quisesse partilhar, não transpunha nada para o papel nem lhe procurava dar voz.
O que pretendo partilhar não são necessariamente experiências arrebatadoras. Aliás, mesmo que contadas na primeira pessoa, elas não são necessariamente autobiográficas (daí os mistérios por desvendar se manterem); por vezes são coisas semelhantes aquelas fotografias que não damos muita atenção quando passamos por elas no álbum das memórias. Mas ficaram com uma cor especial, uma luz que marca um momento, um sorriso que valeu a pena registar. Nada mais do que isso.
Quando se passa a fronteira da competição, e se acha que a produção artística é mais do que produção, começamos a perceber que o verdadeiro encanto está muitas vezes nos retratos das coisas simples.
Ainda vou tendo dificuldade em fazê-lo. Normalmente sou invadido pelo sentimento de que as letras que escrevo não dão conta do recado, não transparecem tudo aquilo que gostava de contar acerca do assunto. Mas, entre outras coisas, ainda me resta a voz. E essa, pode sempre ajudar a contar o que ficou por dizer. Só é pena ser ainda mais difícil do que passar tudo para o papel. Ainda bem que existes, Steve!!! E ainda bem que me convidaste para te ouvir!

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